20 de mar. de 2007

CRESCIMENTO E MORTE DE MICROORGANISMOS

Do ponto de vista biológico o processo de crescimento representa um aumento ordenado de todos os componentes de um organismo. Isto significa que uma célula viva é um sistema dinâmico com um padrão específico de organização, imposto por sua estrutura genética, o qual é perpetuado através da assimilação de nutrientes e a habilidade de se reproduzir.

No estudo do fenômeno do crescimento, a taxa na qual o organismo é dividido, ou melhor, o número de gerações ocorridas em um determinado período, apresenta um interesse maior do que simplesmente determinar o número atual de organismos vivos a cada hora. As espécies bacterianas são caracterizadas por uma taxa de crescimento excepcionalmente alta, sendo este fator reconhecido como de grande importância no esquema de sobrevivência biológica. Como a taxa de crescimento está diretamente relacionada à taxa de metabolismo, pode-se dizer que quanto maior for o organismo, mais lento é o crescimento.

Em qualquer célula, o processo de crescimento demanda a presença de um grande número de diferentes enzimas e proteínas. Além disso, outras moléculas precisam estar presentes, tais como ácidos nucléicos, lipídios e carboidratos. Todos os organismos compartilham uma composição química, o mais importante desta composição é a invariável presença de 3 (três) tipos de macromoléculas orgânicas complexas: Ácido Desoxirribonucléico (DNA), Ácido Ribonucléico (RNA) e proteínas. O DNA é a substância celular que serve de repositório de informações que identificam o organismo em termos de propriedades específicas, estando altamente confinado ao núcleo da célula. O RNA parece estar profundamente envolvido nos complexos padrões de síntese de proteínas, estando a maior parte desta substância localizada no citoplasma da célula. As proteínas, por sua vez, funcionam como catalisadores ou enzimas responsáveis por toda a variedade de operações da célula.

O tamanho da menor das células microbianas é regido pelas limitações básicas de manutenção da função celular. Uma definição de tamanho celular é difícil de ser compreendido até que seja possível visualizar que um organismo ocupando apenas 10-12 ml e consistindo de apenas 2.5 x 10-18 g de matéria seca contém centenas, talvez milhares, de diferentes tipos de moléculas de ácido nucléico e proteína organizadas no espaço e tempo, de tal forma que o seu funcionamento resulte na perpetuação das espécies. Devido à grande variação de tamanho das células, definiu-se que o tamanho deveria ser medido em termos do volume celular para as várias unidades estruturais, representativas das maiores e menores formas de vida microbiana

Na prática, é comum expressar a taxa de crescimento em termos do número de gerações por hora. A geração é definida como a duplicação do número de células ou, em outras palavras, o tempo necessário para a cultura duplicar em concentração ou massa, também conhecido como Tempo Médio de Geração, comumente chamado de Tempo de duplicação. Uma vez que organismos unicelulares multiplicam-se em progressão geométrica em um determinado período de tempo, a população total aumenta como uma potência (expoente) de 2. Assim, uma bactéria produz 2, 2 produzem 4, 4 produzem 8, 8 produzem 16 e assim sucessivamente. Se partirmos do pressuposto de que nenhuma célula morrerá durante o processo, essa relação pode ser expressada da seguinte forma:

20 -> 21 -> 22 -> 23 -> 24 ->. . . -> 2n

Os expoentes representam o número de gerações.

Se os logaritmos dos números de organismos em uma cultura em crescimento exponencial for plotado em relação à unidade de tempo, uma relação em linha reta pode ser observada, conforme a figura abaixo:



Quando a representação gráfica do crescimento exponencial for plotada em uma escala semi-logarítmica, a inclinação da linha registra a taxa de crescimento da cultura. Quanto maior a inclinação da reta, maior a taxa de crescimento da cultura. Da mesma forma, quanto menor for a inclinação da reta ou quanto mais próxima do eixo horizontal, menor é a taxa de crescimento. Quando se é conhecido o número de células presentes em uma cultura em crescimento exponencial em dois determinados períodos, o tempo de geração pode ser calculado diretamente por meio da equação:

G (número de gerações) = (log N1 – log N0­) / log 2, onde:

N0 = número de células no tempo t0
N1 = número de células no tempo t1

Se, por exemplo, a cultura inicial contivesse 100 células e seguisse crescendo exponencialmente até que chegasse a 110.000.000, o número de gerações seria:

(log (108) – log (102)) / log 2 = (8-2) / 0,3 = 20 gerações.

Se este aumento da população ocorrer no período de 10 horas, a taxa de crescimento seria de 20/10, ou 2 gerações por hora.

A CURVA DE CRESCIMENTO

Estudos realizados com diferentes espécies de microorganismos mostraram que o poder reprodutivo completo das células não pode ser mantido por um período longo de tempo. A população microbiana torna-se limitada pela escassez de nutrientes essenciais, ou quando se desenvolve um equilíbrio iônico desfavorável (pH) ou pela acumulação de substâncias tóxicas no ambiente.

A história de qualquer cultura é marcada por uma série de fases de crescimento relativamente distintas e consecutivas que, quando plotadas, mostram uma curva de crescimento típica. Esta curva pode ser dividida em várias seções ou fases como mostradas na figura abaixo e representadas pelas letras de A a H no gráfico.

Fase Estacionária Inicial (Initial Lag Phase)

Em seguida à inoculação de células microbianas viáveis em um meio líquido, ocorre um período estacionário, com duração entre 2 e 3 horas, durante as quais o número de células não mostra nenhum aumento em relação ao número de células inicialmente inoculadas. Esta fase é conhecida como Fase Estacionária e representa um período de ajuste e adaptação das células ao seu novo ambiente. A forma e a duração deste período estacionário inicial dependem da natureza das células, do meio de cultura e da temperatura. A fase estacionária estende-se por uma porção da curva de crescimento designada A – B.

Fase Exponencial (Exponential Phase)

O período logarítmico ou exponencial de crescimento é caracterizado por uma taxa máxima e contínua de multiplicação celular em um ambiente específico. Nesta fase, certos fatores governam a taxa de crescimento, tais como a espécie microbiana, a natureza e a concentração de nutrientes no meio, o pH e a temperatura de incubação. Em culturas líquidas normais, a fase de crescimento exponencial não dura mais do que 2 a 4 horas, podendo ser prolongada através do processo de aeração, fornecendo um suprimento adequado de oxigênio ao meio. Quando a aeração é empregada, a taxa de multiplicação não sofre necessariamente um aumento, podendo ser mantida essa taxa de crescimento constante por um período prolongado, gerando assim uma quantidade maior de células. Geralmente, quando a concentração de células se torna superior a 1 x 107 0u 10.000.000 por ml, a taxa de crescimento decairá, salvo adicionemos oxigênio por meio do processo de agitação ou borbulhamento de uma corrente de ar através do meio.

Durante esta fase, os números de organismos aumentam exponencialmente com o tempo, e quando os logarítmos dos números de células são plotados com relação ao tempo, uma relação em linha reta resulta. Esta característica é mostrada na seção C – D da curva de crescimento representada na figura acima. Ao longo do crescimento exponencial todas as células produzidas são viáveis. Os tempos de geração variam de acordo com as diferenças hereditárias das espécies. Sob condições ótimas, a Escherichia Coli se divide aproximadamente a cada 20 min. O Estafilococos apresenta um tempo de geração similar, mas o bacilo da tuberculose necessita de 5 a 9 horas para a divisão. Outras espécies mostram taxas de multiplicação intermediárias.

Fase Estacionária Máxima (Maximum Stationary Phase)

A fase de incremento logarítmico é seguida por uma fase chamada estacionária, durante a qual o número máximo de organismos viáveis permanece constante. Esta fase corresponde à seção E – F da curva de crescimento. Durante este período a taxa de mortalidade e a taxa de formação de novas células se equilibram. A exaustão do suprimento de alimentação resulta em fome, possível super população e o acúmulo de substâncias tóxicas oriundas do metabolismo são fatores que contribuem para a redução do crescimento e o aparecimento da fase estacionária máxima. O suprimento deficiente de oxigênio também é um fator limitante desta fase. Em relação ao tempo, uma cultura pode permanecer nestas condições por horas, talvez dias, antes da morte das células ser verificada. No caso do organismo ser capaz de produzir esporos resistentes, a fase estacionária pode ser prolongada indefinidamente.

Fase de Morte (Death Phase)

Com o aumento progressivo na taxa de mortalidade, a cultura entra na fase de morte ou na fase de declínio, mostrada na seção F – H na curva de crescimento. Tão logo uma taxa de mortalidade constante seja estabelecida, a cultura começa a morrer exponencialmente e o número de sobreviventes se torna cada vez menor, até finalmente ocorrer a esterilidade, estando o ciclo de crescimento completo. Precisamos perceber, no entanto, que desvios da ordem exponencial de morte não são incomuns. Por exemplo, depois da maioria das células ter morrido, a taxa de mortalidade pode mostrar um decréscimo marcado pelo fato de um pequeno numero de células continue a sobreviver por alguns meses. O crescimento continuado desta pequena população de sobreviventes pode ser atribuído à disponibilidade de nutrientes oriundos de células que morrem e se decompões lentamente. Alguns pesquisadores acreditam que o canibalismo pode ser um mecanismo que mantém uma cultura viável por períodos longos e indefinidos. Esta condição também é chamada de crescimento crítico ou recrescimento.

O Significado da Morte

Morte microbiana é um fenômeno estatístico. Como aplicada a uma célula individual, a morte representa uma redução irreversível do processo vital, essencial para o crescimento e a reprodução. A morte de microorganismos pode ser medida apenas pela determinação do número de células viáveis na população. Por esta razão, o número viável ou o número de sobreviventes remanescentes depois do contato com uma influência destrutiva é o único meio viável para a determinação da morte.

Critério de Morte

O diagnóstico da morte em uma população de organismos unicelulares não é um processo simples. O único critério prático é a falha do organismo em se reproduzir quando plantado em um meio adequado ou quando sujeito a um ambiente ótimo. A escolha do meio de cultura e as condições de incubação são fatores críticos no teste de viabilidade ou de morte. Um organismo ferido pode crescer em um tipo de meio de cultura, mas não em outro, os mesmo exibir uma prolongada fase estacionária. Após a exposição a raios-x, luzes ultravioletas ou a certos produtos químicos tóxicos, os organismos podem perder sua habilidade de reprodução, e ainda continuar a sua função de forma normal por um longo período. Estas condições demandam que o meio selecionado para sobrevivência seja especificado cuidadosamente, incluindo propriedades que auxiliem no reparo de danos celulares adquiridos na exposição a agentes letais, e o tempo de incubação necessário para o crescimento ocorrer.

Mesmo adotando o critério de morte acima estabelecido, é necessário reconhecer que uma célula microbiana pode ser considerada morta apenas quando as condições de teste são mantidas invioladas e permitem a determinação factual da viabilidade ou não. Um ponto que merece toda a atenção e respeito é a adaptabilidade da célula microbiana, seu poder de reparo e recuperação e o impacto destas características biológicas sobre a habilidade humana de desenvolver métodos seguros de esterilização, desinfecção e sanitização.

Fonte: John J. Perkins, Principles and Methods of Sterilization in Health Sciences, Second Edition.

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